Pérolas Negras: o clube que nasceu de uma ONG no Haiti enfrenta o Paraná
A união entre esporte, educação, respeito, inclusão, paz e justiça. O conjunto destes valores - e outros - formam a Academia Pérolas Negras, ou somente Pérolas Negras, próximo adversário do Paraná na Série D. O jogo será no domingo (19), às 15h, no estádio do Trabalhador, em Resende, no interior do Rio de Janeiro.
"O Pérolas é filho da ONG Viva Rio", explica o diretor técnico de futebol do clube, Marcos Badday. O Pérolas tem origem na Organização Não Governamental (ONG) Viva Rio, instituição com tradição de mais de 25 anos atuando no Rio de Janeiro, e que tem o apoio do criador da academia George Soros e, entre outros, da família Marinho, dona da Rede Globo.
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O projeto do Pérolas Negras começou depois do terremoto de 2010 no Haiti, que devastou o país.
"A Viva Rio mandou brasileiros para fazer um trabalho recreativo com a garotada, porque como o país foi todo destruído, as crianças não tinham escola, atividades, nada. Um milionário doou um dinheiro e então foi feito um centro de treinamento lá no Haiti", conta Badday.
O que era uma atividade recreativa, passou a ter um tom mais profissional de treinamentos.
"Quando a maioria dos jovens do país estava na faixa dos 17 anos, o presidente Rubem César Fernandes resolveu levar o projeto para outro lugar, porque no Haiti não tem futebol profissional", acrescenta. Foi aí que, em 2016, o projeto desembarcou no Brasil, mais especificamente na cidade de Resende, no Rio de Janeiro.
Desde então, o Pérolas só tem crescido como instituição. Em 2017, o clube se filiou à Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (FERJ) e passou a disputar campeonatos de relevância estadual. Dentre as categorias sub-20, profissional e feminino, o clube já chegou à 19 finais, tendo conquistado 16 títulos.
A última delas, a Copa Rio 2021, foi a competição que deu o direito do clube disputar a Série D pela primeira vez. A nível estadual, o Pérolas saiu da Série C, equivalente à quinta divisão do Rio, para a Série B1, terceira divisão, em apenas cinco temporadas. O clube, inclusive, só não subiu para a Série A2 carioca porque acabou com o vice-campeonato da terceirona no ano passado.
"Nesses anos, nós chegamos em 19 finais, com 16 títulos. Ano passado, ganhamos a Copa Rio, mas perdemos para o Olaria na final da B1 e não conseguimos subir. Por um acaso infeliz, ano passado, a FERJ só subiu um time em vez de dois, que é o normal do campeonato", explicou o diretor de futebol.
"Garrinsha", outros refugiados, e destaques do elenco atual
O centro esportivo Pérolas Negras, localizado em Bon Repos, Zona Norte de Porto Príncipe, ainda existe no Haiti. Vez ou outra, jogadores que se destacam são mandados para o Brasil para intensificarem os treinamentos.
Foi deste intercâmbio que surgiu o um "novo Garrincha", o Garrinsha Estinphile. Sem as pernas tortas, o jovem meia-atacante, 20 anos, tem buscado seu espaço. Nesta Série D, tem aparecido pouco nas escalações do técnico Maurinho Fonseca.
"Ele é muito bom. É jovem ainda, mas muito talentoso. O pai era fã do Garrincha, mas por opção ou erro, escreveu Garrinsha com S. Ele está na equipe profissional, mas, como é o primeiro ano dele, ainda não está sendo titular, mas ele é muito bom, muito habilidoso", afirma Marcos Badday.
No profissional, além do Garrinsha, mais dois atletas são refugiados do Haiti: o zagueiro Badio Stanley e o atacante Sadson. Dois ex-jogadores, que participaram do projeto, mas não tiveram futuro na carreira, também seguem no clube: o agora roupeiro Basquin e o supervisor do time Solon.
"Nós temos essa preocupação de encaminhar quem não der certo do futebol", explicou.
No grupo atual, o Pérolas também tem nomes conhecidos da torcida paranaense, como o do volante Vico, que estava no elenco do Paraná na Série C, mas não chegou a atuar no ano passado, e o do zagueiro experiente Sosa, que foi campeão da Série D e C com o Operário.
"Está uma equipe bem misturada. Temos jogadores experientes, remanescentes e uma safra de garotos que subiram do sub-20. Está bem diversificado nosso elenco", declarou o dirigente.
Projeto do Pérolas trouxe jovens da Síria e foi destaque nacional
Um projeto encabeçado pelo diretor Marcos Badday, em 2018, também trouxe quatro jovens refugiados da Síria. Em uma série de quatro episódios, a história virou destaque no programa Esporte Espetacular, da Rede Globo. Os jogadores também gravaram depoimentos para a novela Órfãos da Terras, da emissora carioca. Os quatro atletas treinaram no Pérolas, jogaram no time sub-20, no Rezende e hoje estão atuando no Catar.
"Eu fui com um preparador físico fazer um processo seletivo em um campo de refugiados lá em Zaatari na Jordânia. Lá tinha um campinho onde eles jogavam pelada. De 150 jovens, a gente escolheu quatro. E os quatro deram certo. Jogaram no Rezende, no Pérolas e agora estão Catar", conta. Assista à história aqui.
Objetivo na Série D e futuro do clube
O Pérolas Negras é apenas o sétimo colocado do Grupo 7, com três pontos em quatro partidas. Estreante, o objetivo do clube é buscar a classificação, pelo menos, à próxima fase.
"O primeiro objetivo era de fazer uma participação digna, pois somos apenas uma equipe da B1 aqui do Rio, enfrentando equipes de Séries A estaduais. Mas estamos acreditando tanto no nosso trabalho, tão satisfeitos com o elenco, que estamos sonhando em passar de fase. Hoje, nosso sonho é classificar nesta primeira fase", projeta Badday, que também comenta que, para o futuro próximo, o clube quer virar um Sociedade Anônima do Futebol (SAF).
"Começamos com a ONG, mas hoje já temos nossos patrocinadores. Estamos cada vez mais independentes. A Viva Rio ajudou a nascer, mas hoje o Pérolas já tem suas receitas independentes. Se hoje alguém quiser doar, é diretamente para o clube. Já estamos, inclusive, em um processo para virar clube-empresa", finaliza. Saiba mais sobre o Pérolas Negras.