Argentinos driblam crise e invadem o Catar atrás da seleção e de Messi
Qualquer um imaginaria que um país cuja moeda se desvalorizou em 380% nos três últimos anos, que tem aplicado severos e crescentes controles cambiais, impõe impostos e retenções de até 100% sobre o valor do dólar oficial, convive com cerca de 100% de inflação anual e que acabou com a possibilidade de compras parceladas, funcione como barreira intransponível para que os seus torcedores viajem ao Catar. Pois é exatamente o contrário que acontece com a Argentina.
Nesta terça-feira, milhares deles foram ao Estádio Lusail para torcer por Messi e companhia, na estreia da Argentina na Copa do Mundo. Enfrenta a Arábia Saudita às 7h (horário de Brasília), pelo Grupo C.
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Segundo informações da Fifa, os argentinos são os sul-americanos que mais demandaram entradas para os jogos. Ficaram, inclusive, dois postos acima dos brasileiros, outro povo fanático e com população (215 milhões de habitantes) quatro vezes e meia acima da Argentina (47 milhões), mesmo sendo o real a moeda que mais se valorizou até outubro de 2022 e o Brasil um país sem barreiras cambiais, o contrário da Argentina.
A Argentina terminou como o sétimo país que mais buscou ingressos para o Mundial, com 61.083 entradas, sem considerar os argentinos que vivem no exterior e que compraram por meio dos seus atuais países de residência. Antes aparecem Catar, EUA, Arábia Saudita, Inglaterra, México e Emirados Árabes Unidos. Superou França, Brasil e Alemanha.
ESTRATÉGIAS
As autoridades calculam que pelo menos 35 mil passageiros já partiram em direção a Doha. Mas, como fazem os argentinos para driblar as dificuldades diante da profunda crise econômica?
As estratégias são estritas de acordo com a classe social, mas todas implicam esforços para juntar dinheiro, conseguir rotas alternativas de voo e hospedagem econômica.
Jonatan Luna, de 32 anos, vive de bicos, tendo os ofícios de pintor de paredes e de ocasional taxista como os principais. Decidiu cumprir o sonho de ir a uma Copa há dois anos e meio. Usou todas as reservas que tinha, intensificou os bicos e restringiu todos os gastos ao máximo.
"Eu duvidava entre ir ao Catar ou ter a minha própria casa. Neste país, tudo é muito complicado. O meu dinheiro perdia valor todos os dias. Não sabia o que fazer. Resolvi apostar no sonho de ir à Copa. Gastei tudo o que tinha. A casa virá depois, quando der para juntar dinheiro, ou continuarei a alugar a vida toda", explica Jonatan ao Estadão.
De Salta, a 1.500 km de Buenos Aires, Christian Cardozo, de 44 anos, adotou três estratégias básicas, além de restringir saídas e gastos pessoais. Aderiu a um clube de milhas, mudou de casa e aumentou a carga de trabalho. "Distribuía pães a bares e restaurantes da manhã à noite. Passei a distribuir também aos hotéis, a partir das 3 da manhã, porque ninguém queria pegar esse trabalho. Passei a trabalhar 12 ou 14 horas por dia. Vi nesse trabalho extra a chance de ir ao Catar", contou Christian.