Países mais corruptos atraem Copa do Mundo, que vira instrumento geopolítico – Parte 2
A coluna traz um artigo em cinco partes sobre como a Copa do Mundo há 15 anos "escapou" da Europa Ocidental, onde estão os maiores clubes, jogadores e técnicos e o melhor futebol praticado no planeta. A maior competição entre seleções migrou neste século para países classificados como mais corruptos e serve de ferramenta no jogo geopolítico de uma pequena e rica nação. Abaixo, a segunda parte. Clique aqui para ler a primeira.
Morto em 2014, Julio Grondona, presidente da Associação de Futebol Argentino (AFA) desde o final dos anos 1970 era um dos três dirigentes sul-americanos que teriam embolsado gordas quantias para votar no Catar como sede do Mundial de 2022, derrotando os Estados Unidos. Outro era Nicolás Leoz, que faleceu em seu país, o Paraguai, em 2019, em prisão domiciliar e com pedido de extradição feito pelos americanos. O trio era completado por Ricardo Teixeira, ex-presidente da CBF e ex-genro de João Havelange, que presidiu a Fifa. Os dois últimos acabaram indiciados em 2015.
Também entrou na lista Jack Warner, cartola do futebol de Trinidad e Tobago. Só ele teria recebido US$ 5 milhões para votar na candidatura da Rússia. Outro dirigente de país centro-americano sem peso no futebol e que apareceu na lista foi Rafael Salgueiro, guatemalteco que admitiu culpa ante acusações de fraude e lavagem de dinheiro. Seu voto pelos russos foi mais "baratinho", US$ 1 milhão.
O menor Estado do Brasil é Sergipe, com 21.915 Km²: quase o dobro da extensão territorial do Catar, com 11.437 Km². Realmente, por mais que tenha dinheiro oriundo de suas enormes reservas de gás natural e petróleo, trata-se de um país muito pequeno e a Copa do Mundo lá acontecendo algo surreal, que só pode ser explicado pela maneira como o futebol passou a ser gerido há algumas décadas.
Então, voltemos ao ranking da Transparência Internacional. Sabe-se que os países que concentram o melhor do futebol no mundo ficam na Europa, que abriga as principais ligas, os maiores jogadores e técnicos. Lá estão os craques, o dinheiro, a qualidade em maior escala, pois o continente reúne paixão pelo esporte, tradição e poderio econômico, de marketing etc. Lá também estão as quatro últimas seleções campeãs do mundo.
E também pela questão geográfica, um Mundial de futebol em solo europeu apresenta vantagens diversas, até pela estrutura de transporte e hotelaria que os países de lá possuem. Mas quando a bola rolar no Catar em 2022, já teremos mais de 16 anos sem Copa do Mundo na Europa ocidental – a Rússia é um país imenso que se estende até a Ásia.
Até o final do século 20, o certame mais importante da Fifa se revezava desde os anos 1950/1960 entre sede europeias e americanas. Vejamos: Suécia em 1958, Chile 1962, Inglaterra 1966, México 1970, Alemanha 1974, Argentina 1978, Espanha 1982, México 1986, Itália 1990, Estados Unidos 1994 e França 1998. Em 2002 essa sequência foi quebrada com a primeira Copa dividida entre dois países, os asiáticos Japão e Coreia do Sul.
Os germânicos não se curvaram a todas as imposições da Federação Internacional em 2006. As pilastras do Estádio Olímpico de Berlim, sede dos Jogos de 1936, não foram removidas como desejavam. O estádio do Borussia Dortmund, então Westfalenstadion e hoje Signal Iduna Park, não acabou demolido para a construção de um novo, como pediram. E Munique ergueu sua arena apenas após o povo aprovar a ideia em plebiscito.
Assim, a Alemanha fez o seu evento quatro anos depois de sul-coreanos e japoneses. Depois, a competição tomou outros rumos, sendo realizada por três edições seguidas em nações nas quais a tolerância, a subserviência às exigências da Fifa são maiores, casos específicos de África do Sul, Brasil e Rússia. Uma enorme farra com obras caríssimas feitas especificamente para um torneio que dura um mês.
Na terceira parte, quinta-feira, 29 de abril: Copa "foge" da Europa Ocidental e como o Catar utiliza eventos em sua estratégia de defesa
Leia a primeira parte: Países mais corruptos atraem Copa do Mundo, que vira instrumento geopolítico – Parte 1