A tarde na qual pensei ter visto um gol de Pelé
Eu vi Pelé. Em campo, todo de branco, jogando futebol. Foi em 9 de setembro de 1973, nove dias depois de meu 10º aniversário. Criança, já apaixonado pelo futebol, ciente de que aquele domingo seria especial, saí de Niterói para o Maracanã, com meu pai, para acompanhar Flamengo x Santos.
O time rubro-negro contava com três companheiros e o técnico do Rei no tricampeonato conquistado no México três anos antes pela seleção brasileira. Foram escalados por Zagallo o ponta-direita Rogério, o artilheiro Dario, o Dadá Maravilha; e o, à época, ponteiro-esquerdo Paulo César Lima, o PC Caju.
De quebra, na meta estava Renato, goleiro campeão brasileiro pelo Atlético Mineiro em 1971 e que iria ao Mundial da Alemanha em 1974. Também titulares foram Zico, então com 20 anos, e Geraldo, craque contemporâneo e grande amigo do maior camisa 10 da história do clube, que chegou cedo ao selecionado nacional e morreria precocemente em 1976 durante uma cirurgia de amígdalas.
Pelé tinha como companheiros no time santista o mítico arqueiro Cejas, e mais tricampeões de 1970, como o capitão Carlos Alberto, Clodoaldo e Edu. Um desfile de craques e grandes jogadores para os 48.397 torcedores que compraram ingressos, proporcionando uma renda de 408.509 cruzeiros.
Naqueles dias o time do Rei era tema de polêmica. Exatas duas semanas antes, na final estadual, Santos e Portuguesa empataram. Veio a disputa de pênaltis e o controverso árbitro Armando Marques errou nas contas, dando o título aos santistas. Contudo, o duelo não estava matematicamente decidido e, mais tarde, os dois clubes dividiram o título paulista.
Sobre a partida, me refresca a memória o acervo digitalizado do Jornal dos Sports, tão importante em minha alfabetização e onde tive a honra de trabalhar 15 anos mais tarde. No relato do jogo, a boa atuação do jovem Zico e de Pelé, os camisas 10, apontados pelo diário como os melhores em campo.
Embora não me recorde de todos os detalhes da peleja, segue clara a sensação de ter visto um gol dele, quando o Santos assinalou o único tento da partida. Foi aos 18 minutos, após falha do lateral-esquerdo Mineiro, ao tentar recuar a bola, perigosamente, para o zagueiro Chiquinho.
O passe arriscado foi interceptado por um santista que, de primeira, fuzilou a meta de Renato, definindo a vitória. Ao ver o jogador negro, todo de branco, romper para, na corrida, decidir o confronto e, em seguida, saltar pelo gramado dando socos no ar, pensei: "Gol de Pelé".
Seria, digamos, menos frustrante aquela derrota caso minha impressão inicial fosse correta. Contudo, o tento único do cotejo fora marcado por Edu, parceiro do Rei no Santos e nas duas Copas anteriores, que corria pela ponta-esquerda com o número 11 às costas. Na cancha, fisicamente eles eram bem parecidos.
No final, não vi gol, mas posso dizer que, uma vez na vida, fui a um estádio de futebol e, realmente, vi Pelé.