O singelo retorno do alquebrado futebol brasileiro. Vivemos tempos estranhos
O futebol brasileiro é admirado em todo mundo pela quantidade de jogadores revelados e de títulos conquistados.
Já foi muito mais reverenciado, exatamente por alguns de seus principais rivais europeus, gente que disputou títulos e Copas do Mundo com o Brasil.
Com a escassez de triunfos consagradores – o último Mundial foi há 20 anos –, participações discretas nas recentes Copas e esvaziamento técnico dos seus times por um descontrolado êxodo de jogadores, o futebol brasileiro perdeu muito do seu encantamento.
Os franceses sempre foram o povo que mais admira e estuda o nosso futebol, que mais publica livros e ensaios sobre ele, mas os ingleses pouco ficam atrás.
Os ingleses eram tão fãs que nos convidavam sempre para que a seleção abrilhantasse a Copa Stanley Rouss, popularizada como Copa Umbro, no começo de cada temporada. Profissionalmente, estive em pelo menos quatro ou cinco edições entre os anos 1980 e 1990.
Verifiquei que os ingleses são capazes de descer de seu orgulho nacional, capazes de descer do seu orgulho de inventores do futebol, para se curvarem em admiração ao futebol brasileiro.
Em termos técnicos, óbvio, pois em organização e planejamento ficamos muito para trás. Não há termos de comparação entre a milionária Premier League inglesa e as competições promovidas pela CBF e suas federações.
Os ingleses cunharam a expressão “beautiful game”, o "jogo bonito", para designar o estilo brasileiro de jogar. Mas ultimamente a crônica esportiva da Inglaterra tem manifestado sua preocupação com a queda vertical da qualidade do futebol brasileiro, embora, por enquanto, ainda não o esteja chamando de “ugly game”, o "jogo feio".
A constatação pura e simples é que os europeus aprenderam a lição de casa, evoluíram tática e tecnicamente, suaram a camisa e hoje em dia nadam de braçada nos seus lucrativos e movimentados campeonatos.
No plano técnico a dura constatação da nossa decadência ficou registrada na eliminação da seleção pentacampeã para a esforçada Bélgica na Copa da Rússia.
Enquanto isso, continuamos com um calendário mal formulado, tanto que ainda existem os estaduais em formato absolutamente anacrônico.
Aliás, o Campeonato Paranaense volta a ser disputado neste final de semana em meio a pandemia do coronavírus. O Carioca já voltou e já acabou, com o Flamengo campeão. O singelo retorno do alquebrado futebol brasileiro tem sido acompanhado com cautelas.
Além do flagrante desinteresse pelos torneios estaduais, que deveriam se transformar em festas do interior, observa-se uma disputa fratricida entre a maioria dos grandes clubes e a principal rede de televisão do país.
Ninguém discute o direito de reivindicação por maiores verbas, equilíbrio na divisão das receitas, etc., mas não se pode perder a visibilidade e o interesse público pelo já desgastado futebol brasileiro.
Antigamente os times viviam exclusivamente da renda obtida nas bilheterias dos locais onde se realizavam os jogos; depois, passaram a agregar a arrecadação com a venda do direito de transmissão para a tevê e, consequentemente, a publicidade fixa nos estádios e nos uniformes das equipes.
Como será o amanhã?
Tempos confusos de muitas discussões, ideologias, politizações, exacerbações, asneiras e pouca racionalização.
Estamos vivendo tempos estranhos.
Antônio Carlos Carneiro Neto nasceu em Wenceslau Braz, cresceu em Guarapuava e virou repórter de rádio e jornal em Ponta Grossa, em 1964. Chegou a Curitiba no ano seguinte e, mais tarde, formou-se em Direito. Narrador e comentaris...