O artista de rua sofre nas mãos dos treinadores
Acompanhando a trajetória da seleção brasileira no Pré-Olímpico
percebi o quanto os técnicos atrapalham os jogadores no futebol atual.
Mesmo contando com grandes revelações e talentos raros, que
logo se firmarão no cenário internacional, o treinador André Jardine insiste em
mexer constantemente no time, promover rodízios ou simplesmente atazanar a vida
dos garotos com sistemas táticos rígidos e engessadores.
O resultado é que, de uma classificação tranquila, a seleção
brasileira terá de vencer a Argentina para chegar a Tóquio.
Isso me recordou uma entrevista do holandês Johan Cruyff, um dos maiores astros de todas as Copas e que, na condição de treinador, revolucionou o Barcelona. Ele louvava, à revista francesa “L´Equipe”, ao que denominou de jogador de rua.
Na época, inicio da década de 1990, estabelecia uma
distinção entre o futebol brasileiro e o europeu: para ele, no Velho Mundo,
faltava esse tipo de jogador que faz seu aprendizado nas ruas, nos terrenos e
nas praias brasileiras. Na Europa quando surge um jogador assim, logo vira
exceção. Como ele.
E ainda citava Beckenbauer e Platini, como outros craques de
rua. E curvava-se diante da genialidade de Pelé e tantos outros brasileiros.
Qual seria o privilégio do jovem que faz as primeiras
embaixadas e joga as primeiras peladas nas ruas?
Segundo Cruyff, seria a liberdade.
A oportunidade de escapar ao jogo dos técnicos que, nas
escolinhas dos clubes, começam a tolher a criatividade e o individualismo de
meninos de 10 e 12 anos, obrigados desde cedo a assimilar esquemas, exigências
e obrigações no futebol dito moderno.
Craque como poucos e convertido a treinador, o saudoso
Cruyff talvez não soubesse que aqui no Brasil sofremos do mesmo mal – o
tecnicismo que persegue e inibe o jogador, da escolinha à seleção.
Voltando a seleção brasileira pré-olímpica, é triste
observar jogadores talentosos e com natural vocação para a prática do futebol
tenham que se submeter a escravização da rigidez das táticas e à opção dos
treinadores pela tarefa mais fácil e mais cômoda da destruição.
Marcar, marcar sempre, ocupar o espaço, obstruir, impedir a
ação do adversário, são algumas palavras de ordem que os meninos inventivos e
criativos estão cansados de ouvir.
Os atuais treinadores não sabem que um drible pode ser mais
bonito do que um gol.
Ou a imagem do desconcertante drible de Marcelo Cirino, na final da Copa do Brasil no Beira-Rio, mais do que o gol de Rony para o Athletico, não ficou eternamente gravada na retina dos puristas e apaixonados pelo futebol arte ?
Sou fã dos jogadores que desafiam os técnicos e passam a vida correndo e driblando para fugir dos medíocres.
Antônio Carlos Carneiro Neto nasceu em Wenceslau Braz, cresceu em Guarapuava e virou repórter de rádio e jornal em Ponta Grossa, em 1964. Chegou a Curitiba no ano seguinte e, mais tarde, formou-se em Direito. Narrador e comentaris...