O futebol brasileiro entre gigantes e anões: os técnicos gringos e os locais
Em “As Viagens de Gulliver”, do escritor inglês Jonathan Swift, de 1726, o herói viaja em países imaginários: em Liliput, os habitantes medem 15 centímetros de altura; em Brobdingnag, têm 18 metros. Há também um país onde cavalos dotados de raciocínio e de razão governam antropoides degradados.
Trata-se de ficções satíricas, em que o autor critica a sociedade inglesa da época e nas quais se pretende provar a relatividade das teorias intelectuais e das instituições políticas.
Pois bem, no Brasil dos dias atuais, vivemos situação
semelhante, com políticos e governantes que se sentem verdadeiros gigantes
diante de uma assustada e desprotegida sociedade que se enxerga como anã.
Estamos inseguros, incrédulos e sem confiança de que as coisas possam melhorar a curto ou a médio prazo. Claro que a terrível pandemia do coronavírus virou tudo do lado do avesso. Não só aqui, mas no mundo inteiro.
A sociedade humana conseguiu destruir a economia mundial por causa de um micróbio desconhecido e mal resolvido. Médicos, cientistas, epidemiologistas, sanitaristas, autoridades em geral, todos estão levando um banho de bola do tal Covid-19.
O futebol também não escapou ileso.
Além dos jogos sem público nos estádios e da incrível
incapacidade dos árbitros brasileiros para operar o chamado VAR – o apitador de
campo tornou-se inseguro e os observadores na cabine de televisão demoram uma
eternidade para entender o processo – caiu verticalmente o padrão técnico da
maioria absoluta das equipes.
O nível técnico baixou na razão direta da descontrolada
exportação de jogadores para o exterior. Mas tem mais: há pelo menos uma década
o futebol brasileiro não consegue revelar a quantidade expressiva de bons
jogadores como no passado glorioso da seleção pentacampeã mundial.
Contam-se nos dedos os craques de hoje e, sobretudo, os jogadores fora de série.
Como são especialistas em cometer equívocos, os cartolas do
futebol brasileiro resolveram considerar os treinadores nativos verdadeiros
anões mentais e os estrangeiros em indiscutíveis gigantes da criatividade. Ledo
engano.
Nem os técnicos nacionais são tão fracos, nem os gringos são tão geniais. Ah, mas o português Jorge Jesus deu um show com o Flamengo no ano passado. Menos, por favor.
Com o grupo de jogadores reunidos seria praticamente
impossível não se tornar campeão carioca e campeão brasileiro. Na Copa do
Brasil ele foi eliminado pelo Athletico, no Maracanã.
A conquista da Copa Libertadores da América foi um golpe de sorte, pois o River Plate sofreu a virada no final do jogo decisivo. E, como se sabe, o Flamengo foi derrotado pelo Liverpool na decisão do título mundial de clubes. Agora tudo o que vem de fora é melhor.
Claro que os treinadores brasileiros se tornaram argentários
com seus salários irreais, se descuidaram da evolução natural própria de
qualquer atividade esportiva, aceitaram o joguinho dos dirigentes que promovem
verdadeiro espeto corrido de besteiras em seus respectivos clubes e, pouco a
pouco, foram perdendo terreno no processo.
Como não são chamados para trabalhar fora do país – um pouco pela dificuldade idiomática, um pouco porque não têm prestígio mesmo – observa-se um rosário de ilustres desempregados no mercado futebolístico.
Antônio Carlos Carneiro Neto nasceu em Wenceslau Braz, cresceu em Guarapuava e virou repórter de rádio e jornal em Ponta Grossa, em 1964. Chegou a Curitiba no ano seguinte e, mais tarde, formou-se em Direito. Narrador e comentaris...