A inexplicável mania brasileira de poupar jogadores
Antes que os preparadores físicos tomassem conta do futebol brasileiro de forma definitiva – algo que aconteceu por volta de 1994, quando a seleção ganhou o tetracampeonato mundial em decisão nos pênaltis com a Itália, e com um time tecnicamente distante das outras conquistas mundiais do nosso futebol – não se ouvia falar em rodízio de jogadores.
Pré-temporada, sim, sempre foi importante, entretanto os mal formulados calendários do futebol sul-americano sempre atrapalharam o bom rendimento das equipes. Aliás, muitos espertos treinadores usaram para justificar alguns fracassos nos primeiros meses do ano, as pré-temporadas deficientes como bode expiatório.
Para quem não sabe, o bode era separado do rebanho e deixado
aos cuidados da natureza como parte dos rituais religiosos dos hebreus na
antiguidade. Nele estavam depositados os pecados do povo de Israel e servia
como um gesto de expiação.
Bode expiatório é um termo usado para definir um individuo ou acontecimento sobre o qual recaem as culpas de um grupo de pessoas.
Nas últimas décadas o futebol começou a perder o brilho
técnico, um pouco pela rigidez dos sistemas de marcação e muito pelo
condicionamento dos atletas que passaram a usar mais a força física do que
eventuais recursos técnicos.
Os treinadores contribuíram para a queda do padrão técnico do futebol em geral por inibirem, desde as categorias de base, as iniciativas do drible, da liberdade, da criatividade ou das travessuras com a bola que encantavam as plateias, em nome do futebol coletivo.
Ou, por outra, ao tirarem a liberdade para criar dos novos
jogadores transformaram os times em projeto do autor. Mais ou menos como
aconteceu no cinema, onde os diretores passaram a dominar os filmes
sobrepondo-se aos produtores e, sobretudo, aos atores.
Este culto ao futebol coletivo, sem a arte individual de um
Garrincha ou de um Cruyff, por exemplo, transformou a maioria das partidas
insuportável. Até parece que não existem mais bons jogadores.
As atuais exceções servem apenas para confirmar a regra geral. Para piorar as coisas surgiu a inexplicável mania brasileira de poupar jogadores. Todo técnico se acha no direito de escolher entre titulares,
reservas ou até juvenis – hoje em dia conhecidos como sub-20 – quando eles
devem ou não jogar.
Estão exagerando nas exigências. Tudo isto pesa nos ombros e nas pernas dos jogadores que se mostram cada vez mais inseguros. Enquanto na Europa, com os clubes mais organizados e mais ricos do mundo, com um calendário inteligente e racional, os times jogam sempre completos, por aqui o futebol está virando uma chatice.
Ligamos a televisão e vemos toda quarta e domingo os melhores jogadores dos clubes europeus em ação: Messi, Benzema, De Bruyne, Sterling, Cristiano Ronaldo, Mbappé, todos enfim.No Brasil, não. É um tal de poupar titulares e mexer constantemente nas
equipes que poucas conseguem manter o padrão de jogo.
Basta recordar do último Campeonato Brasileiro, quando São Paulo e Internacional lideraram a maior parte da competição, mas entregaram o título, de mão beijada, ao Flamengo, com melhores jogadores no plano individual.
Antônio Carlos Carneiro Neto nasceu em Wenceslau Braz, cresceu em Guarapuava e virou repórter de rádio e jornal em Ponta Grossa, em 1964. Chegou a Curitiba no ano seguinte e, mais tarde, formou-se em Direito. Narrador e comentaris...