Mário Lobo Zagallo: mito ou lenda?
A história é inflexível. Duas vezes como jogador (1958-1962), uma vez como técnico (1970) e uma vez como coordenador (1994), Zagallo foi campeão mundial pelo Brasil.
Mas até sua morte, Mário Lobo Zagallo tem a capacidade de provocar controvérsias. A sua exaltação de o “o maior vencedor de Copas” encerra a existência de legado no futebol que será importante para as futuras gerações?
Como ensina Friedrich Nietzsche, que não há fatos eternos, como não há verdades absolutas” (Humano, Demasiado Humano).
Como jogador, Zagallo não foi o melhor do seu tempo na Seleção e no seu time. No Flamengo, era o complemento de Evaristo de Macedo e Dida. No Botafogo, auxiliava os gênios, como Garrincha, Didi e Nilton Santos. Na "Seleção de Ouro”, que ganhou o bicampeonato mundial na Suécia (1958) e no Chile (1962), era o coadjuvante de Zito, Didi, Garrincha e Pelé.
A sua marca principal como jogador é o direito autoral do esquema 4-3-3. Quando a ordem tática no futebol mundial era restrita ao 4-2-4 (Brasil, França, Hungria), ao “Ferrolho Suiço” ou “Catenaccio” (Alemanha e Italia) e ao WM (Inglaterra), na Suécia, contra a Áustria, em 1958, Zagallo deu um passo atrás. Por conta própria, juntando-se a Zito e Didi no meio campo, criou o 4-3-3. Em Zagallo, jogando bola pela esquerda, descobriu-se um gênio. O ponta esquerda nunca mais foi o mesmo.
Depois do jogador, surgiu o treinador. E é aí que se provoca a questão mais complexa da sua carreira. A sua presença na Seleção Brasileira era pela sua capacidade de armar e mudar times influindo na conquista de títulos ou era cativo no sistema da CBF por ser o homem de confiança de João Havelange e Ricardo Teixeira?
Conhecer futebol, a alma do jogador e orientá-lo, Zagallo era mestre. Aproveitando-se do regime militar imposto à Seleção de 1970, foi o responsável pela formação do melhor Brasil de todos os tempos, que ganhou o tricampeonato, no México.
Embora os seus críticos relativem a sua importância diante da genialidade de Clodoaldo, Gerson, Tostão, Pelé, Jairzinho e Rivelino, o testemunho pessoal de Tostão e do falecido Carlos Alberto Torres encerra a dúvida: Zagallo foi quem armou o time de 70. Falou Carlos Alberto, que excluindo Edu da ponta esquerda a favor de Rivelino, abriu a vaga no meio para Clodoaldo sua “menina dos olhos”. Para o Brasil sair jogando de trás, transformou Piazza de um razoável volante para um excepcional zagueiro.
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Com a soberba brasileira de ignorar a evolução dos outros, atribui-se a ele o desprezo à Holanda de Cruyff com a afirmação de que “os holandeses é que têm que nos conhecer”. O Brasil fracassou em 1974, embora o amigo Carpegiani, que forma o meio de campo, conte-me que “o nosso primeiro tempo contra a Holanda foi fantástico”.
Crítico de Coutinho (1978) e de Telê Santana (1982-1986) voltou para coordenar o Brasil de Parreira, nos Estados Unidos, ganhou no erro de Baggio, a última imagem do título de 1994. Com ele de técnico, o Brasil perdeu em 1998 (França), e como coordenador, perdeu em 2006 (Alemanha).
Elas por elas, com Zagallo ficou no empate. Com ele, o Brasil ganhou quatro Copas e perdeu quatro Copas. Nenhum profissional teve a oportunidade de participar de tantos mundiais. Não há dúvida, foi a referência da Seleção Brasileira pela capacidade, pela confiança da CBF e pela sorte, que segundo ele, decorria do número 13. Ele próprio ao usar a sorte como argumento reduzia suas próprias qualidades, transformando-se em personagem.
Frasista, bradou certa vez aos imortais Juca Kfouri, Juarez Suarez, Flávio Prado e José Trajano, do Cartão Verde, da Cultura: “vocês vão ter que me engolir”. Depois de Pelé e Garrincha, é o maior simbolo da Seleção do Brasil. Lendas e mitos criam-se. Símbolos, não.