Acredite se quiser

Daniel Castellano / Gazeta do Povo
Renan Foguinho lamenta oportunidade perdida na derrota para o Paraná: para a Rádio CAP está tudo normal

No domingo de folga, tirei o fim de tarde para ouvir Atlético e Paraná pela Rádio CAP. O objetivo era ter certeza absoluta de algo moleza de suspeitar. É possível o veículo oficial de um clube, qualquer agremiação, transmitir uma partida com imparcialidade (um pouco, que seja) e tudo mais que uma jornada de futebol exige?

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Duas horas depois, a confirmação: não, não é possível. Os comunicadores rubro-negros até mostraram alguma isenção. Nos dois gols anulados do Furacão, por exemplo, afirmaram que o árbitro agira corretamente – embora num deles tenha pairado uma certa dúvida. Foi louvável. Mesmo assim, não dá.

Uma rádio oficial propagando os compromissos do clube só funcionaria quando não houver mais distinção entre vitória, empate e derrota no esporte. Em outras palavras, quando opinião e análise forem irrelevantes.

Como não creio que um dia isso vá ocorrer, a transmissão do clássico foi uma longa sessão de constrangimento e comprometimento. Tendo, como ponto alto, o momento do gol do Tricolor, o único do confronto.

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Há quem diga que a bola na rede é o orgasmo do futebol. Para quem ouvia a Rádio CAP, no domingo, pareceu ser o, digamos, “fenômeno inverso”. A cabeçada do zagueiro Anderson que venceu o goleiro Santos foi registrada com um grito curto e chocho: “goool”. E não poderia ser de outro jeito.

Mas o pior veio após o apito final. No papo com os jogadores e o treinador Arthur Bernardes, a impressão era de que tudo estava na mais perfeita ordem, embora tenha sido o terceiro resultado ruim do Atlético sub-23 no fraco campeonato estadual. Nenhuma pergunta que o atleticano, infeliz com o rendimento do time, desejaria escutar.

Considerando ainda as restrições impostas aos jornalistas – não há janelas de imprensa nos treinos, as rádios “normais” não podem realizar entrevistas nos jogos e as partidas não passam na televisão –, o cenário me faz lembrar daquela seita chamada Cultura Racional, imortalizada por Tim Maia em três discos fantásticos nos anos 70.

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No caso do movimento oriundo do Rio de Janeiro, os seguidores tinham de ler e reler os volumes (cerca de mil, tratando, entre outros assuntos, da vinda de seres “lindos e perfeitos” em discos voadores) do livro Universo em Desencanto. “Leia o livro”, repetiam os chamados “caravaneiros” à exaustão.

A diretoria do Furacão impõe preceito praticamente idêntico aos seus torcedores: “leia o site”, ou, no caso específico, “ouça a rádio”. No portal oficial na internet – tão monótono que parece ser produzido diretamente de um cubículo na China – estão as respostas para qualquer questionamento, de acordo com os dirigentes. Acredita quem quer.

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