Na segunda metade de sua vida, viu-se o Athletico perdido numa selva escura como a descrita por Dante na Divina Comédia: “Tão cruel e amarga que a simples lembrança me traz de volta o medo”. Falo do Pinheirão, onde numa tarde, em 1991, a exausta torcida esqueceu do jogo e foi para baixo das sociais cobrar a volta à Baixada.
Sempre imagino os eventos subsequentes como uma passagem bíblica. No camarote, o presidente José Carlos Farinhaki estava só, mas ouviu uma voz: “Leva este povo para a terra prometida”. Ainda em transe, tomado por este espírito, disse ao povo que o faria. Ao despertar, lhe perguntaram quando começariam as obras. “Na segunda-feira!”, garantiu.
Farinhaki chegou ao Athletico nos anos 1970, no tempo da retaguarda atleticana. Foi diretor de futebol nos títulos de 1983, 1985 e 1988. Homem do povo, sabe tudo de bola e de boleiros. Em 1989, porém, o Athletico estava na pior, na Série B nacional e preso a um contrato leonino no Pinheirão. Nenhum dos cardeais atleticanos tinha colocado o nome para disputar a presidência.
Farinhaki, que tinha começado uma carreira de empresário e ganhado uma grana vendendo alguns jogadores, estava tomando uma cerveja no Bek’s e decidiu colocar seu nome no pleito. “Minha ideia era fazer os atleticanos ricos se coçarem”, ele sempre conta. Não apareceu ninguém e ele concorreu sozinho.
Ao assumir como presidente, com sua prosódia peculiar, disse que iria subir e seria campeão. Pois subimos e fomos campeões. Já bastaria para levá-lo ao panteão atleticano. Mas havia mais. Ele peitou poderosos que queriam um shopping na Baixada e bancou a volta para casa ao liderar um grande mutirão atleticano. Saiu da presidência, em 1993, deixando o estádio pronto para ser inaugurado.
Quem o sucedeu, porém, nem o convidou para a festa. Mas a torcida o reconheceu e o ovacionou nas arquibancadas batizando de “Farinhacão” aquela versão do estádio. Sempre que o encontro na Baixada, agradeço ao “tirado das águas”, o profeta polaco que liderou o povo em seu êxodo para salvar nossa Baixada.